31.7.10

os três mal amados :: de joão cabral de melo neto

*
"Joaquim:

O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço. O amor comeu meus cartões de visita. O amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome".

~

bibliografia:
poema "Os Três Mal Amados", do livro João Cabral de Melo Neto - Obras Completas, Editora Nova Aguilar S.A. - Rio de Janeiro, 1994, pág.59.

30.7.10

:: a casa de lá ::



O espetáculo A Casa de Lá conta a estória de um casal desde a infância até a velhice. Um casal como qualquer outro – com suas tristezas e alegrias, suas partidas e chegadas. Inspirado na obra de Guimarães Rosa e fruto de um trabalho de pesquisa desenvolvido no Vale do Jequitinhonha (MG), o espetáculo – que reúne o Teatro Diadokai, o grupo Girau e o ator Cristiano Peixoto, e já foi apresentado em Belo Horizonte, Rio de Janeiro e São Paulo – está de volta à cena mineira para uma temporada no

Galpão Cine Horto, de 29 de julho à 1º de agosto.


Idéia original :: Cristiano Peixoto
Direção :: Ricardo Gomes

Dramaturgia :: Ricardo Gomes e Cristiano Peixoto (livremente inspirada na obra de João Guimarães Rosa e nas histórias orais dos moradores do Vale do Jequitinhonha, em especial Josefa Alves dos Reis (Dona Zefa) e Antônio Luis de Matos (Mestre Antônio)

Elenco :: Amanda Prates, Cristiano Peixoto e Priscilla Duarte
Direção musical e Trilha sonora original :: Amanda Prates
Músicos :: Grupo Girau - Gabriela da Costa e Daniel Guedes
Figurino ::Priscilla Duarte
Cenário :: Bruna Christófaro
Teatro de sombras :: criação - Paulinho Polika e Thaís Moreira / Manipulação :: Bárbara Henriques e Natali Bentley
Iluminação :: Felipe Cosse


Assistente de Iluminação :: Tainá Rosa
Coordenação de produção :: Regina Célia
Produção executiva :: Gabriela da Costa
Luthier :: Antonio Moreira
Cenotécnicos :: Antonio Moreira e Joaquim Agostinho Costureira :: Maria Guiomar da Silva
Projeto gráfico :: Otávio Santiago
Filmagem :: Mauricio Resende
Fotografia :: Naty Torres
Administração :: Silvia Batista

26.7.10

Os amorosos

*
de Jaime Sabines
(tradução livre :: patrícia mc quade)

Os amorosos calam.
O amor é o silêncio mais fino,
o mais temeroso, o mais insuportável.
Os amorosos buscam,
os amorosos são os que abandonam,
são os que mudam, os que esquecem.
Seu coração lhes diz que nunca vão encontrar,
não encontram, buscam.

Os amorosos andam como loucos
porque estão sós, sós, sós,
entregando-se, dando-se a cada momento,
chorando porque não salvam o amor.
Preocupa-lhes o amor. Os amorosos
vivem o dia, não podem fazer mais, não sabem.
Sempre estão indo,
Sempre, para alguma parte.
Esperam,
Não esperam nada, mas esperam.
Sabem que nunca vão encontrar.
O amor é a delonga perpétua,
sempre o passo seguinte, o outro, o outro.
Os amorosos são os insaciáveis,
Os que sempre – que bom! – vão estar sós.

Os amorosos são a hidra do conto.
Têm serpentes no lugar de braços.
As veias do pescoço se incham
também como serpentes para asfixiá-los.
Os amorosos não podem dormir
porque se dormem lhes comem os vermes.

Na escuridão abrem os olhos
E lhes sobressalta o espanto.

Encontram escorpiões debaixo do lençol
E sua cama flutua sobre um lago.

Os amorosos são loucos, só loucos,
sem Deus e sem diabo.

Os amorosos saem de suas covas
temerosos, famintos,
para caçar fantasmas.
Riem das pessoas que sabem de tudo,
das que amam o perene, verídicamente,
das que acreditam no amor como uma lâmpada de inesgotável azeite.

Os amorosos brincam de agarrar água,
de tatuar fumaça, de não se ir.
Jogam faz tempo, o triste jogo do amor.
Ninguém há de resignar-se.
Dizem que ninguém há de resignar-se.
Os amorosos se envergonham de toda conformidade.

Vazios, mas vazios de uma a outra costela,
a morte lhes fermenta atrás dos olhos,
E eles caminham, choram até a madrugada
quando trens e galos se despedem dolorosamente.

Sentem às vezes um cheiro de terra recém nascida,
de mulheres que dormem com a mão no sexo, gozosas
de córregos de água carinhosa e de cozinhas.
Os amorosos cantam entre lábios
uma canção não aprendida,
e se vão chorando, chorando,
a formosa vida.

***

para ler o poema em espanhol, acesse lobos y cabritos :: de gabriela carrión

***

22.7.10

~

*
"Foi ontem, e é o mesmo que dizermos, Foi há mil anos, o tempo não é uma corda que se possa medir nó a nó, o tempo é uma superfície oblíqua e ondulante que só a memória é capaz de fazer mover e aproximar
".
(josé saramago)

*

SARAMAGO, José. O Evangelho segundo Jesus Cristo.
São Paulo: Companhia das Letras, 2010, p. 168.

21.7.10

escena XIX :: calderón de la barca :: la vida es sueño

*
(tradução livre :: patrícia mc quade)



É verdade, pois reprimamos
esta fera condição,
esta fúria, esta ambição
se alguma vez sonhamos.
E si faremos, pois estamos
num mundo tão singular,
que o viver só é sonhar;
e a experiência me ensina
que o homem que vive sonha
o que é até despertar.
Sonha o rei que é rei, e vive
com este engano mudando,
dispondo e governando;
e este aplauso que recebe
emprestado, no vento escreve,
e em cinzas se converte
a morte (augúrio forte!)
O que há com quem tenta reinar?
Vendo que há de despertar
no sonho da morte!
Sonha o rico em sua riqueza
que mais cuidados lhe oferece;
sonha o pobre que padece
sua miséria e sua pobreza;
sonha o que medir começa
sonha o que afana e pretende;
sonha o que agoniza e ofende;
e no mundo, em conclusão,
todos sonham o que são,
mesmo que ninguém entende.
Eu sonho que estou aqui
destas prisões carregado,
e sonhei que noutro estado
mais lisonjeiro me vi.
O que é a vida? Um frenesi.
O que é a vida? Uma ilusão,
uma sombra, uma ficção,
e o maior bem é pequeno;
que toda a vida é sonho;
e os sonhos, sonhos são.

***

Es verdad; pues reprimamos
esta fiera condición,
esta furia, esta ambición
por si alguna vez soñamos.
Y sí haremos, pues estamos
en mundo tan singular,
que el vivir sólo es soñar;
y la experiencia me enseña
que el hombre que vive sueña
lo que es hasta despertar.
Sueña el rey que es rey, y vive
con este engaño mandando,
disponiendo y gobernando;
y este aplauso que recibe
prestado, en el viento escribe,
y en cenizas le convierte
la muerte (¿desdicha fuerte!);
¿que hay quien intente reinar,
viendo que ha de despertar
en el sueño de la muerte!
Sueña el rico en su riqueza
que más cuidados le ofrece;
sueña el pobre que padece
su miseria y su pobreza;
sueña el que a medrar empieza,
sueña el que afana y pretende,
sueña el que agravia y ofende;
y en el mundo, en conclusión,
todos sueñan lo que son,
aunque ninguno lo entiende.
Yo sueño que estoy aquí
destas prisiones cargado,
y soñé que en otro estado
más lisonjero me vi.
¡Qué es la vida? Un frenesí.
¡Qué es la vida? Una ilusión,
una sombra, una ficción,
y el mayor bien es pequeño;
que toda la vida es sueño,
y los sueños, sueños son.

***

blibliografia: BARCA, Calderón de la. La vida es sueño. Buenos Aires: Olympia, 1995. p. 84, 85.

***

13.7.10

*

me lanço ao fundo do mar e voo até a mais alta estrela
mas eu sei onde fica a terra

~

12.7.10

Aranhas

*
eduardo galeano
(tradução livre :: patrícia mc quade)

Passinho a passo, fio após fio, o aranho se aproxima da aranha.

Oferece-lhe música, transformando a teia em harpa, e dança para ela, enquanto pouquinho a pouco vai acariciando, até o desmaio, seu corpo de veludo.

Então, antes de abraçá-la com seus oito braços, o aranho envolve a aranha na teia e a amarra bem amarrada. Se não a amarra, ela o devora depois do amor.

O aranho não gosta nada desse costume da aranha, de modo que ama e foge antes de que a prisioneira acorde e exija o serviço completo de cama e comida.

Quem entende o aranho? Ele poderia amar sem morrer, teve a manha de cumprir essa façanha, e agora que está a salvo de sua sanha, sente saudade da aranha.

***

bibliografia: GALEANO, Eduardo. Bocas del tiempo. Buenos Aires : Catálogos, 2004, p. 18.

***

a sua :: marisa monte

*


***

A Sua

Composição e voz :: Marisa Monte

Eu só quero que você saiba
Que estou pensando em você
Agora e sempre mais
Eu só quero que você ouça
A canção que eu fiz pra dizer
Que eu te adoro cada vez mais
E que eu te quero sempre em paz

Tô com sintomas de saudade
Tô pensando em você
E como eu te quero tanto bem
Aonde for não quero dor
Eu tomo conta de você
Mas te quero livre também
Como o tempo vai e o vento vem

Eu só quero que você caiba
No meu colo
Porque eu te adoro cada vez mais
Eu só quero que você siga
Para onde quiser
Que eu não vou ficar muito atrás

Tô com sintomas de saudade
Tô pensando em você
E como eu te quero tanto bem
Aonde for não quero dor
Eu tomo conta de você
Mas te quero livre também
Como o tempo vai e o vento vem

Eu só quero que você saiba
Que estou pensando em você
Mas te quero livre também
Como o tempo vai e o vento vem
E que eu te quero livre também
Como o tempo vai e o vento vem

***


11.7.10

*

*

bom dia, amor!
bom dia! insiste ela de novo.
— os sonhos cor-de-rosa
são tão ordinários quanto as meninas pálidas —
ao pensar assim, varia o sonho dalva decor,
concorda no azul, talvez.
e no amarelo de sua memória
há todo desejo branco de ser amada:
verde todo dia, lilás toda noite, verde-água a vida inteira.
bom dia, bom dia!
com a doçura vermelha de quem se quer amada,
muito, sempre e de novo.
bom dia!
matizes sabor laranja.

ad infinitum

*

*

"... os espelhos e os sonhos são coisas semelhantes,
é como a imagem do homem diante de si próprio..."
(josé saramago)

*

SARAMAGO, José. O Evangelho segundo Jesus Cristo.
São Paulo: Companhia das Letras, 2010, p. 38.

4.7.10

el lado oscuro del corazón :: con poesía de mario benedetti

*


recorte de "El Lado Oscuro del Corazón" de eliseo subiela, argentina.
dario grandinetti y sandra ballesteros cantan poemas de mario benedetti.

nuestro poeta benedetti aparece como un náufrago jubilado cantando versos en alemán a una aburrida muchacha
al final del video.

No te salves

mario benedetti

No te quedes inmóvil
al borde del camino
no congeles el júbilo
no quieras con desgana
no te salves ahora
ni nunca
no te salves
no te llenes de calma

no reserves del mundo
sólo un rincón tranquilo
no dejes caer los párpados
pesados como juicios

no te quedes sin labios
no te duermas sin sueño
no te pienses sin sangre
no te juzgues sin tiempo

pero si
pese a todo
no puedes evitarlo
y congelas el júbilo
y quieres con desgana
y te salvas ahora
y te llenas de calma
y reservas del mundo
sólo un rincón tranquilo
y dejas caer los párpados
pesados como juicios
y te secas sin labios
y te duermes sin sueño
y te piensas sin sangre
y te juzgas sin tiempo
y te quedas inmóvil
al borde del camino
y te salvas
entonces
no te quedes conmigo.

***


Não se salve

(tradução livre :: patrícia mc quade)


Não fique imóvel
à margem do caminho
não congele seu júbilo
não ame sem vontade
não se salve agora
nem nunca
não se salve
não se farte de calma

não reserve do mundo
só um canto tranquilo
não deixe cair suas pálpebras
pesadas como juízos

não fique sem lábios
não se durma sem sonho
não se pense sem sangue
não se julgue sem tempo

mas se
apesar de tudo
não puder evitar
e congela seu júbilo
e ama sem vontade
e se salva agora
e se farta de calma
e reserva do mundo
só um canto tranquilo
e deixa cair suas pálpebras
pesadas como juízos
e se seca sem lábios
e se dorme sem sonho
e se pensa sem sangue
e se julga sem tempo
e fica imóvel
à margem do caminho
e se salva
então
não fique comigo

***

3.7.10

um soneto :: para o embalo de sábado à noite

*
Mario Quintana

Esses inquietos ventos andarilhos
Passam e dizem: “Vamos caminhar.
Nós conhecemos misteriosos trilhos,
Bosques antigos onde é bom cismar...

E há tantas virgens a sonhar idílios!
E tu não vieste, sob a paz lunar
Beijar os seus entrefechados cílios
E as dolorosas bocas a ofegar...”

Os ventos vêm e batem-me a janela:
“A tua vida: Que fizeste dela?”
E chega a morte: “Anda! Vem dormir...

Faz tanto frio...e é tão macia a cama...”
Mas toda a longa noite ainda hei de ouvir
A inquieta voz dos ventos que me chama!...

***

bibliografia sonhada:
QUINTANA, Mário. A rua dos Cataventos. p. São Paulo: Globo, 2005. p. 36;


***