19.5.09

errata sobre o poema :: assim eu queria o último adeus



"Os perigos da espontaneidade, por antônio cícero:

TANTO O poeta francês Paul Valéry quanto o nosso João Cabral de Melo Neto, que costumava citar o primeiro, desconfiavam de que tudo o que lhes chegasse espontaneamente, à maneira de inspiração, era eco de alguma coisa que houvessem lido, ouvido ou percebido de alguma maneira. Por isso, só confiavam no que resultasse de um trabalho rigoroso, que eliminasse tudo o que fosse alheio".

fragmento retirado do blog: acontecimentos de antônio cícero

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explico-me:

me pego em flagrante no domingo à tarde depois de postar o poema "assim eu queria o último adeus" neste blog. meu computador estava dando pau para assistir aos filmes do youtube e eu tentava instalar um programa que resolvesse o problema. consegui com a ajuda de um amigo que me orientou por telefone. e para testar se funcionava, eu fui ver novamente o vídeo que havia postado dia 14/02 em memória saudosa a manuel bandeira, um fragmento do filme O habitante de pasárgada. fiquei chocada! eu havia plagiado na maior inocência praticamente um verso inteiro dele! no filme ele recita um poema chamado: "O último poema".

continuo a explicar-me:

enquanto bandeira pensa no último poema, eu penso no último adeus. de alguma forma isso ficou na minha memória gravado, no meu arquivo imemorial, pois eu não sabia que copiava uma ideia dele, o 'meu' poeta. além disso, ele diz em seu poema sobre flores quase sem perfume, e eu digo sobre a flor delicada que guarda seu perfume. e mais: ele fala sobre os suicidas que se matam sem explicação, e eu sobre a pulsão prozac dos suicidas perdidos no deserto.

mas eu me jubilo agora, pois esse choque suavisou quando, procurando o poema plagiado para postar aqui neste depoimento, eu encontro despropositadamente uma crônica de fernando sabino chamada "A última crónica" e que termina: “Assim eu quereria minha última crônica: que fosse pura como esse sorriso”.

ufa! minha consciência ficou mais calma e eu assumo agora com tranquilidade o poema que postei, plagiado discaradamente de meu poeta preferido, manuel bandeira. mas sem título de comparação: eu só estou engatinhando no fazer poético da coisa, ele já é estrela guia dos poetas que ainda balbuciam com insegurança seus próprios versos.

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O último poema

Assim eu quereria o meu último poema.
Que fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionais
Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas
Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume
A pureza da chama em que se consomem os diamantes mais límpidos
A paixão dos suicidas que se matam sem explicação.

Manuel Bandeira

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concluo:

cada nova criação literária é como um mexer, remexer e reremexer, se for necessário, no balaio de gatos de tudo o que você já leu e viveu. não há nada de novo na literatura, tudo já foi dito ou escrito. o interessante hoje é em como você volta a dizer isso novamente a partir de suas experiências e usando a sua capacidade de recriar. é a crise atual da originalidade que em mim não dói de forma alguma, ainda mais depois dessas descobertas que eu aqui compartilho.

obrigada bandeira por me servir também de inspiração!

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